São 07h00 e o alarme já soa a tarde, quando o sol e o gato Brown já me acordaram há já quase 1 hora…
Acordar, levantar, dar de comer aos gatos, aos cães, arejar a casa, 30 minutos de Yoga e meditar sobre o dia que começa. É preciso ver os pintos que nasceram há 3 dias, dar verdura e cevada às galinhas, abrir a estufa, mudar as regas para mais logo, limpar os regos da horta, levar os cães a passear um pouco, ver horas da formação on-line, verificar pedidos de serviços/alojamento, marcar reuniões, começar apanhar as favas, que já estão no ponto, dar despacho da roupa na Lavandaria, terminar a lavagem das roupas de cama de inverno.
Ainda não estamos em Maio, mas o calor já se faz sentir há 1 mês e a chuva não veio este ano, antevê-se um Verão quente, de um bafo de correntes quentes que irão soprar com força, varrendo estes olivais e esta planície, não poupando nada nem ninguém durante quase todo o dia…
Mas temos que ser positivos, na verdade, depois de quase 3 anos, de uma mudança desde Sintra e de abertura de um Alojamento Local em contexto rural, em pleno COVID-19, em Outubro de 2020, já se avançou muito e apesar de tantas contrariedades, o caminho é para continuar.
A vida no interior nem sempre é fácil, nem romântica, como a pintam…Nem tão pouco a gestão de uma pequena empresa familiar num lugar remoto e sozinha, mas quando se ouve a Antena 1 pela manhã: “…trânsito(…)custo da habitação(…)insegurança(…)massificação do turismo(…)a falta de tempo(…) o stress…”, percebo que sou abençoada pela vivência por entre as coisas simples e poder apreciar as mesmas, com vagar – o canto dos pássaros, o silêncio, a natureza, abrisa morna dos finais de tarde, o nascer do sol, o lusco-fusco, este céu que cobre o Monte, o contacto com pessoas, muitas vezes de nacionalidades diferentes e de outras terras, que aqui vêm em busca de paz, familiaridade, autenticidade.
Sim, na verdade, mesmo muitas vezes tendo de apertar os cordões à bolsa, da distância, que se faz mais próxima com a dita internet…Não há cinemas, centros comerciais, clínicas privadas, grandes eventos, mas há ainda a calma dos dias, a Amizade de alguns que como eu abraçaram novos desafios no interior, o aconchego de alguns locais que me acolheram como família, o tempo e as estações do ano, que vamos vendo pintadas na paisagem que nos rodeia.
Ainda assim, com um Seguro de Saúde Privado, ainda não tive queixas dos profissionais que cuidaram de mim e dos meus, aquando de 2 ou 3 situações de urgência e mesmo em consultas de rotina e exames médicos. Aqueles que conheci, desempenham o seu trabalho da melhor forma possível e tratam de nós até com carinho e esmero. A distância da capital, 2 horas, ainda não se fez sentir assim tanto, confesso.
Não vou a Lisboa desde Janeiro de 2021 e não sinto falta, mesmo. Fiz as primeiras férias em quase 7 anos, no passado mês de Janeiro, 4 dias, ena!!! Mas rumei ao Centro do país que adorei. Apesar de a minha vida ser um pouco presa aqui no Monte, com os animais, o Alojamento, apenas intercalada com alguns Tours Privados que faço, tenho sempre vontade de conhecer mais do interior do meu país, tão imenso na sua diversidade cultural, paisagens e nas suas gentes. Oxalá possa visitar os meus colegas da Rural Move nas suas terras, terei muito orgulho nisso.
Durante os trabalhos no Monte, e as caminhadas aqui em volta, reflito muitas vezes sobre as vantagens de viver aqui e sobre os problemas que se destacam e, que são muitas vezes transversais nas regiões ditas de baixa-densidade: o envelhecimento da população, a falta de acessibilidades, a ausência de oportunidades de trabalho para quadros qualificados e de Serviços de Saúde e de Entidades Formativas, a par de melhores acessos de Internet/Fibra. Contudo, acredito que passa por cada de um de nós cidadãos, criar iniciativas junto das Juntas de Freguesia e respetivas Câmaras – nós pertencemos a Serpa, mas temos Moura e Vidigueira muito próximas, assim com Beja.
Debate-se muito a falta de iniciativa por parte dos Autarcas, mas se não tivermos vontade e Acão para começar a construir pontes entre o dito litoral e interior e, criar condições para que gente mais jovem se estabeleça nestes territórios, nada irá mudar. Ainda se contam pelos dedos alguns jovens que se mudaram de outros territórios para aqui, tenho conhecido exemplos, que certamente falarei numa próxima oportunidade e que me fazem pensar que talvez o interior seja mesmo o futuro face a um custo de vida cada vez mais elevado nas grandes cidades e a uma inflação galopante, que muitas vezes não deixa espaço, nem oportunidades de melhoria de condições de vida.
Apesar das muitas carências, pelo menos aqui semeamos e plantamos muito do que comemos, produzimos o nosso Azeite e tentamos colocar a sustentabilidade no nosso modo de vida diário – sem químicos, e com o reaproveitamento de muito do que utilizamos para outros fins e atividades. Não há gastos supérfluos, otimizamos quase tudo, desde roupa a objetos, tudo tem uma segunda vida, o que é bastante importante para a nossa filosofia de vida.
Iremos passo a passo dando também o nosso contributo, não só com a questão da divulgação da nossa região junto dos que nos visitam em colaboração com muitos parceiros, mas igualmente com a criação de alguns postos de trabalho – colabora ativamente connosco uma jovem com 42 anos com 2 filhos, a Elsa e, que no final do ano passado criou o seu próprio negócio na área de Lavandaria&Houseeeping, a par de um senhor, o Joaquim, com mais de 50 anos que tem o seu contrato de trabalho e nos ajuda na parte agrícola, jardinagem e manutenção, desdeNovembro do ano passado. Compreende-se que as pequenas empresas que se vão aqui fixando, são também importante para criar oportunidades de trabalho para os locais e também vitais, para a sua subsistência face à ausência de oferta de trabalho e de mão de obra qualificada. Acredito que nós, pequenos Empresários, somos também relevantes para que se estabeleça um maior equilíbrio e justiça social em regiões bastante carenciadas de oportunidades de trabalho de longo prazo. Naturalmente e a pouco e pouco se vão construindo caminhos com futuro, que podem também abrir outros para aqueles que querem vir para aqui viver.
A questão da internet é fulcral, temos tido alguns trabalhadores remotos e que querem procurar outro modo de vida, mas que têm necessariamente de ter as condições de trabalho ideais – aqui não há fibra ótica em muitos locais e nós, conseguimos ter aqui um sistema que nos ajuda a trabalhar quase em igualdade como as pessoas que desenvolvem a sua atividade profissional em Lisboa ou no Porto. Esta será também a chave para a fixação de mais gente no interior, seguramente. Estamos com a Rural Move, a tentar chamar a atenção para esta realidade junto de alguns dos nossos Autarcas, porque o Alentejo, sendo a maior região do país, e nosso Baixo- Alentejo, maioritariamente assente na produção Agrícola e Agro-Pecuária, necessita de gente jovem qualificada que aqui se estabeleça por prazos maiores que a dita sazonalidade do Turismo. Há quem nos chame a atenção para o facto de termos sol quase todo o ano, qualidade de vida e segurança, fatores tão importantes e que são escassos em muitas outras partes do país.
Quero acreditar que em 2016 tomei a decisão certa, quando comecei a preparar a minha mudança para este território em Agosto de 2020, que a par de tantos outros em Portugal, tem um potencial enorme, mas que cabe a cada um de nós valorizar e ativar no presente, para ser também Futuro.
Tenho 47 anos, quase 48, raízes na Beira-Baixa e aqui, não sou Agricultora, nem uma Empresária brilhante, o que aprendi, recebi dos meus Avós, dos meus Pais e do que vou aprendendo todos os dias, mas quero ser sempre alguém que soube desde cedo que é da terra tiramos o que comemos e, que o interior deste país, embora cheio de desafios, tem tudo para dar certo e trazer maior alegria e oportunidades a todos os que o querem abraçar.
Planície como página
este é o chão que procurava silêncio feito asa
quase pão quase palavra. Para ser canto
para ser casa.
In Homenagem ao Alentejo, Manuel Alegre
Um abraço do nosso Baixo-Alentejo, com Amor.
Bem hajam,
Rita Valadas,
Ruralmover no Baixo-Alentejo interior – entre Moura, Serpa, Vidigueira & Vila de Frades #burricodorada #ruralmove #alentejo